Reforma Tributária
A Dinâmica dos Créditos de IBS/CBS: Uma Ameaça à Competitividade do Simples Nacional?
A Reforma Tributária promete simplificar, mas especialistas alertam para efeitos colaterais perigosos no Simples Nacional. Entenda como a busca por créditos de IBS/CBS e as metas fiscais podem ameaçar milhões de pequenas empresas.
Por décadas, a legislação tributária brasileira sobre impostos indiretos foi carinhosamente (só que não) apelidada de “manicômio tributário”. E não é para menos! Se alguém tivesse a hercúlea tarefa de imprimir todas as normas editadas desde a Constituição de 1988 até hoje, o monte de papel A4 pesaria mais de 7,6 toneladas. São mais de 400 mil normas espalhadas por mais de 60 mil páginas – uma imagem icônica desse volume já foi até publicada pelo advogado mineiro Vinicios Leoncio. Diante desse caos, a Reforma Tributária aprovada no ano ado surgiu como um bálsamo, uma promessa de cura para a doença crônica da burocracia. Afinal, o novo conjunto de regras tem o potencial de reduzir esse “peso” legislativo para algo em torno de “apenas” 200 kg de papel. Um alívio e tanto, certo?
Contudo, olhando por uma lente mais crítica e profunda, surge uma preocupação séria: essa tão sonhada simplificação pode trazer efeitos colaterais perigosos, especialmente na forma de uma “desidratação” do Simples Nacional e um aperto para as empresas de serviços. O resultado? Um possível aumento e aceleração na taxa de mortalidade de micros, pequenas e médias empresas (MPEs) por todo o país.
[💡 Ponto Crítico: A simplificação da estrutura tributária é bem-vinda, mas é crucial analisar se as novas regras, na prática, não criarão obstáculos intransponíveis para os regimes diferenciados que são vitais para a sobrevivência de milhões de pequenos negócios.]
Do “Manicômio Tributário” à Simplificação: A Grande Promessa da Reforma
Ninguém contesta a urgência de modernizar nosso sistema de impostos. A complexidade atual é um entrave ao crescimento e um custo enorme para as empresas.
O Peso Insustentável da Burocracia Atual
As mais de 400 mil normas tributárias não são apenas números impressionantes; elas se traduzem em horas incontáveis gastas por contadores e empresários para entender e cumprir obrigações, em insegurança jurídica e em um ambiente de negócios desfavorável. A metáfora das 7,6 toneladas de papel ilustra perfeitamente o fardo que o Brasil carrega.
Reforma como “Tratamento Medicinal”: Redução Drástica no Papelório (e na Complexidade?)
A grande bandeira da Reforma Tributária sobre o consumo, com a criação do IVA dual (IBS e CBS), é justamente a simplificação. Ao unificar PIS, COFINS, IPI, ICMS e ISS em dois tributos principais, espera-se uma redução drástica no volume de leis, decretos e portarias. A estimativa de que toda essa legislação possa caber em “apenas” 200 kg de papel é um símbolo poderoso dessa promessa de desburocratização.
O Outro Lado da Moeda: Efeitos Colaterais da Reforma no Simples Nacional? Um Alerta Necessário!
Apesar do otimismo com a simplificação, uma análise mais aprofundada levanta questões sobre o futuro do Simples Nacional, regime que hoje abriga a vasta maioria das empresas brasileiras e é um grande gerador de empregos.
O Alvo Indireto: Desidratação do Simples e o Olhar Atento no Arcabouço Fiscal
O raciocínio por trás dessa preocupação considera o contexto econômico atual, onde o governo busca desesperadamente atingir as metas do Arcabouço Fiscal. Nessa batalha por equilíbrio nas contas públicas, aumentar a arrecadação e diminuir os gastos são as principais armas.
E onde o Simples Nacional entra nisso?
- Redução da Renúncia Fiscal: O Simples Nacional representa, de longe, a maior fatia da renúncia fiscal no Brasil. Dados mostram que, em uma lista de incentivos acima de R$10 bilhões, o Simples lidera com R$101,8 bilhões anuais. Os seguintes na lista, como a Zona Franca de Manaus (R$ 36,3 bilhões) e a Desoneração da Folha (R$ 26,5 bilhões), estão muito distantes. Reduzir a atratividade ou o alcance do Simples significaria diminuir essa renúncia.
- Diminuição do “Rombo” Previdenciário: O Simples Nacional também é visto por alguns como um “ofensor” no que tange à Previdência. Embora as empresas do Simples contribuam com alíquotas menores ao INSS em comparação com as do Lucro Presumido e Real, seus trabalhadores (incluindo MEIs e funcionários de pequenas e médias empresas) têm direito integral à aposentadoria e aos demais benefícios previdenciários. Uma migração de empresas do Simples para outros regimes, com contribuições previdenciárias maiores, poderia ajudar a reduzir o déficit previdenciário a longo prazo.
Para o governo, “desidratar” o Simples Nacional poderia ser como “matar dois coelhos com uma cajadada só”: reduzir a renúncia fiscal e aliviar a pressão sobre a Previdência.
[🤔 Para Refletir: É possível conciliar as metas do Arcabouço Fiscal com a manutenção da competitividade e da importância social do Simples Nacional, que é o maior empregador do país?]
A Dinâmica dos Créditos de IBS/CBS: Uma Ameaça à Competitividade do Simples?
A principal ameaça ao Simples Nacional dentro da nova sistemática tributária reside na forma como o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) e a Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS) funcionarão, especialmente no que se refere ao conceito de crédito tributário e à não cumulatividade plena.
Grandes Empresas e a Sede Insaciável por Créditos Máximos
A lógica do IVA é que o imposto pago em uma etapa da cadeia produtiva gere crédito para ser abatido na etapa seguinte, evitando o efeito cascata. Com o IBS e a CBS, as empresas (especialmente as maiores, nos regimes de Lucro Real ou Presumido que permitirão o creditamento pleno) terão uma estratégia clara: maximizar a recuperação de créditos em todas as suas compras de bens e serviços.
O Dilema Cruel das Empresas do Simples: Migrar de Regime ou Perder Clientes?
Aqui surge o problema para as empresas do Simples Nacional. Atualmente, o Simples oferece um recolhimento unificado de impostos com alíquotas geralmente menores, mas, em contrapartida, não gera (ou gera muito pouco) crédito dos tributos unificados para seus clientes que não estão no Simples.
Com a nova regra do IBS/CBS, se uma empresa do Simples Nacional continuar recolhendo seus tributos de forma simplificada e com alíquotas inferiores à “alíquota cheia” do novo IVA (que se estima entre 25% e 28%), ela não reará um crédito fiscal robusto para seu cliente PJ. Esse cliente, por sua vez, ao comprar de um fornecedor do Lucro Real ou Presumido (que recolherá o IBS/CBS pela alíquota cheia e gerará crédito integral), terá uma vantagem fiscal.
A consequência? Grandes empresas compradoras podem, na prática, “exigir” ou dar preferência a fornecedores que lhes garantam o maior volume de créditos tributários. Isso pode forçar as empresas do Simples a:
- Migrar para o Lucro Real ou Presumido: Deixando de lado as vantagens do Simples para poder oferecer o crédito cheio aos seus clientes.
- Optar por um Regime Misto (se regulamentado): Algumas discussões apontam para a possibilidade de empresas do Simples optarem por recolher o IBS/CBS “por fora”, com alíquota integral, para gerar crédito pleno. No entanto, isso adicionaria uma complexidade brutal à gestão fiscal das mais de 18 milhões de empresas do Simples, que, em sua maioria, não possuem estrutura para lidar com a apuração de débitos e créditos do IVA.
O “Barato” que Pode Sair Caro
Nesse cenário, uma empresa do Simples Nacional poderá até oferecer um preço de venda menor pelo seu produto ou serviço. Contudo, esse “mais barato” precisará ser bom o suficiente para compensar o crédito tributário menor (ou inexistente) que ela vai gerar para o seu cliente PJ.
Imagine uma grande empresa que compra de, aproximadamente, 3 mil fornecedores. Se hoje mais da metade deles (1.500) são do Simples Nacional e, hipoteticamente, o Simples gerasse um crédito equivalente a 9% (apenas para ilustração), enquanto as empresas do Lucro Presumido/Real reassem um crédito de 28% via IBS/CBS, é natural que haja uma pressão para que esses fornecedores do Simples mudem de regime para se manterem competitivos.
Impacto na Sobrevivência: A Mortalidade das MPEs em Risco Elevado
Essa potencial migração forçada de regime ou a perda de competitividade podem ter consequências desastrosas para a sobrevivência das micro e pequenas empresas.
O Círculo Vicioso: Maiores Custos com Burocracia e Impostos
Ao migrarem para regimes mais complexos como o Lucro Real ou Presumido, as empresas do Simples enfrentarão:
- Aumento da Carga Tributária Direta: As alíquotas efetivas podem ser maiores.
- Custos com Conformidade: Terão que aprender a gerenciar toda a mecânica de débitos e créditos do IBS/CBS, o que exigirá maiores despesas com seus contadores e escritórios de contabilidade.
- Aumento dos Preços de Venda: Para compensar os maiores impostos e custos, precisarão rear isso para seus preços, o que pode afetar ainda mais sua competitividade.
Parece um círculo vicioso e extremamente perigoso para a sobrevivência desses negócios.
Números que Preocupam: Taxas de Mortalidade Atuais e Projeções Sombrias
Atualmente, mesmo com as vantagens do Simples, as taxas de mortalidade das MPEs já são altas. Empresas cadastradas no regime como MEI registram uma mortalidade entre 29% e 35% a cada cinco anos. Já as pequenas e médias empresas do Simples possuem uma taxa um pouco menor, mas ainda expressiva, de 21% a 25% no mesmo período.
Caso a migração de regimes ou a perda de atratividade do Simples se confirme em larga escala, é natural e muito preocupante esperar que esses já elevados índices de mortalidade se tornem ainda maiores e mais rápidos. O agravante é que o Simples Nacional abriga cerca de 84% das empresas instituídas no país, consolidando-se como o maior empregador dos trabalhadores brasileiros. Um aumento na mortalidade dessas empresas teria um impacto social e econômico gigantesco.
[➡️ Fique Ligado! As discussões sobre as Leis Complementares da Reforma Tributária são o momento crucial para que as entidades representativas das MPEs defendam mecanismos que protejam a competitividade e a simplicidade do Simples Nacional no novo cenário.]
O Chamado à Ação: Empresas do Simples Precisam se Reinventar e Lutar por seu Espaço
Diante de todo esse panorama desafiador, a inércia não é uma opção. É fundamental que as empresas optantes pelo Simples Nacional, junto com seus contadores, comecem AGORA a:
- Entender Profundamente suas Fortalezas: Quais são seus diferenciais competitivos além do preço (qualidade, atendimento, agilidade, nicho específico)?
- Analisar sua Cadeia de Clientes: Quem são seus principais clientes? Eles são grandes empresas que vão priorizar o crédito fiscal? É possível negociar ou adaptar a oferta?
- Simular Cenários: Com as primeiras definições das alíquotas e regras do IBS/CBS, simular o impacto de uma eventual migração de regime ou da opção por um regime misto.
- Buscar Eficiência e Inovação: Otimizar custos internos, investir em tecnologia e buscar novas formas de agregar valor para compensar qualquer desvantagem tributária.
- Engajar-se no Debate: Pressionar, através de suas entidades representativas, por soluções dentro da Reforma Tributária que preservem a importância e a viabilidade do Simples Nacional, talvez com mecanismos de crédito presumido para seus adquirentes ou um sistema de transição mais suave.
A Reforma Tributária é uma realidade e trará mudanças estruturais. O desafio para as milhões de empresas do Simples Nacional é encontrar caminhos para não apenas sobreviver, mas para se reorganizar e, quem sabe, sair fortalecidas desta transformação que exige, acima de tudo, estratégia inteligente e capacidade de adaptação.
Quiz Rápido: Teste seu Conhecimento sobre a Reforma e o Simples Nacional!
- Qual é o principal motivo apontado no texto para a Reforma Tributária (com IBS/CBS) poder “desidratar” o Simples Nacional? a) O aumento direto das alíquotas do Simples Nacional. b) A preferência de grandes empresas por fornecedores que gerem mais créditos de IBS/CBS (geralmente fora do Simples). c) A extinção completa do regime do Simples Nacional pela nova lei. d) A obrigatoriedade de todas as empresas do Simples adotarem o Lucro Real.
- Por que o Simples Nacional é considerado o maior programa de renúncia fiscal do Brasil, segundo o texto? a) Porque ele isenta totalmente as empresas de todos os impostos. b) Porque o valor total dos impostos não pagos devido às suas alíquotas reduzidas e unificadas é o mais alto entre todos os incentivos. c) Porque ele permite que as empresas não paguem contribuições previdenciárias. d) Porque foi criado recentemente e ainda não arrecadou o suficiente.
- Qual é uma das principais consequências negativas para uma empresa do Simples Nacional caso ela seja forçada a migrar para o Lucro Real ou Presumido devido à Reforma Tributária? a) Uma simplificação ainda maior de suas obrigações fiscais. b) Aumento da carga tributária direta e dos custos com conformidade (ex: honorários contábeis). c) o automático a mais linhas de crédito subsidiado. d) Redução imediata no preço de seus produtos e serviços.
Respostas Corretas: 1-b, 2-b, 3-b
Resumo dos Pontos Centrais: Simples Nacional na Encruzilhada da Reforma Tributária
- Promessa de Simplificação: A Reforma Tributária visa reduzir a imensa burocracia do sistema atual, unificando tributos sobre o consumo.
- Alerta para o Simples: Apesar dos benefícios gerais, há um risco real de que a nova dinâmica de créditos do IBS/CBS torne as empresas do Simples Nacional menos competitivas para clientes PJ que buscam maximizar créditos fiscais.
- Pressão por Arrecadação: A busca por metas do Arcabouço Fiscal pode incentivar medidas que, indiretamente, levem empresas a sair do Simples, aumentando a arrecadação e diminuindo a renúncia fiscal.
- Risco de Mortalidade: A migração forçada para regimes mais complexos e onerosos pode aumentar as já altas taxas de mortalidade das MPEs, com grave impacto no emprego.
- Necessidade de Estratégia: Empresas do Simples precisam entender profundamente suas fortalezas, analisar seus mercados e se preparar para uma possível reorganização, além de participar ativamente do debate sobre a regulamentação da reforma.
A Reforma Tributária é um marco necessário, mas seus efeitos colaterais precisam ser cuidadosamente monitorados e mitigados, especialmente para proteger o ecossistema vital das micro, pequenas e médias empresas que dependem do Simples Nacional para existir e prosperar.
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